14/08/2020

 Segue nosso estudo de sexta-feira às 19 h.

Livro Ação e Reação  

Capítulo 20 - Comovente Surpresa


Leitura inicial:

MEDICAÇÃO PREVENTIVA


Pense muito, antes da discussão. O discutidor, por vezes, não passa de estouvado.
Use a coragem, sem abuso. O corajoso, em muitas ocasiões, é simples imprudente.
Observe os seus métodos de cultivar a verdade. Muitas pessoas que se presumem verdadeiras, são veículos de pertubação e desânimo.
Proceda com inteligência em todas as situações. Não se esqueça, porém, de que muitos homens inteligentes são meros velhacos.
Seja forte na luta de cada dia. Não olvide, contudo, que muitos companheiros valentes são suicidas inconscientes.
Estime a eficiência. No entanto, a pretexto de rapidez, não adote a precipitação.
Não enfrente perigos, sem recursos para anulá-los. O que consignamos por dessasombro, muita vezes é loucura.
Guarde valor em suas atitudes. Recorde, entretanto, que o valor não consiste em vencer, de qualquer modo, mas em conquistar o adversário no trabalho pacífico.
Tenha bom ânimo, mas seja comedido em seus empreendimentos. Da audácia ao crime, a distância é de poucos passos.
Atenda a afabilidade e a doçura em seu caminho. Não perca, porém, o seu tempo em conversas inúteis.

Fonte: Livro: Livro Agenda Cristã / André Luiz & Francisco Cândido Xavier


Trecho do estudo:

 . . .

Foi assim que, certa noite para nós inesquecível, pobre mulher cadaverizada foi trazida pelos enfermeiros à sala de nossas atividades habituais para o socorro necessário.

O corpo seviciado, que imundos trapos mal cobriam, as mãos cujos dedos terminavam em forma de garras e o semblante completamente alterado por terrível hipertrofia falavam sem palavras dos longos tormentos de que fora vítima.

Embora preliminarmente atendida pela enfermagem da Mansão, a infortunada criatura exalava nauseante bafio.

Druso, no entanto, qual acontecia noutros casos, afagava-lhe a fronte com paternal carinho.

Finda a prece com que assinalava o início da tarefa assistencial, começou a aplicação de passes, acordando-lhe as energias. Em seguida, notando que fundos gemidos se lhe exteriorizavam do peito, o abnegado amigo concentrou os seus potenciais de força magnética no cérebro da infeliz, que começou a mover-se, subitamente reanimada.

 Via-se claramente que Druso interferia no córtex encefálico, incentivando-a ao necessário despertamento.

 Foi então que a boca hirta, arrastada hipnoticamente à movimentação, descerrou-se, de leve, e gritou:

 - Druso!... Druso!... compadece-te de mim!...

Surpreendidos, vimos o chefe da Mansão cambalear, quase desfalecente, qual se fora atingido por invisíveis raios de angústia e morte. Mas a estupefação não o atingira tão-somente. Silas, fazendo-se lívido, avançou para ele, enlaçando-lhe o busto, como se lhe temesse a queda inevitável.

Algo de estranho ocorria, cujo sentido, de pronto, não conseguíamos perceber.

Buscando dominar-se, o venerável diretor ergueu os olhos lúcidos para o Alto, em pranto mudo, invocando a inspiração divina, na linguagem da prece silenciosa em que a alma se comunica particularmente com Deus, e, após momentos rápidos, perguntou à infeliz:

- Irmã, que tens a dizer-nos?

A interpelada abriu os olhos que se reviravam nas órbitas, sem qualquer expressão de lucidez e, parecendo temer a presença de inimigos ocultos, clamou triste:

- Tragam meu esposo!... Druso me perdoará... Estou cansada, vencida. . . Por amor de Deus, libertem-me!... Libertem-me!... Quero ar!... ar puro!... Não terei pago suficientemente o meu crime?... Não creio que Deus nos criasse para o inferno sem-fim.

Se errei, conscientemente, adquirindo grande culpa, não desconheço... que as minhas penas reparadoras... têm sido igualmente enormes!... Conduzam-me à presença de meu esposo... para que me ajoelhe... Druso retirar-me-á do local dos réprobos...

Compreenderá que não sou assim tão cruel, como querem que eu seja... Meu marido era sumamente bondoso, tratava-me como um pai!... Há quantos anos padeço, ó Senhor!? Tu que curaste os leprosos e os endemoninhados, estende-me os braços de amor! Retirame do inferno a que fui arrastada!... Ajuda-me, ó Cristo!... Deixa que eu recolha do esposo que humilhei o perdão de que necessito, para que a minha consciência possa orar com fervor!... O remorso é fogo que me consome!... Piedade!... Piedade!... Piedade!...

 Ante o intervalo que se fizera espontâneo, vimos que o grande condutor jazia entregue a lágrimas copiosas.

Pela primeira vez aos nossos olhos, Silas interferiu no socorro magnético.

Embora o espanto que se lhe estampava na face, com a tácita aprovação do chefe que lhe cedia o lugar em silêncio, interrogou, preocupado e indeciso:

- Como te chamas?

- Aída. . . - foi a resposta que nos despertou mais acurada atenção.

O Assistente, contudo, no evidente propósito de obter mais informes, tão seguros quanto possíveis, continuou indagando em voz trêmula:

- Aída, se és a esposa de Druso, como nos fazes crer, não te recordas de mais alguém? De mais alguém que te partilhasse no mundo a vida no lar?.

- Oh! sim... - retrucou a interlocutora com indizível carinho - lembro-me... lembro-me... Meu esposo trazia um filho das primeiras núpcias, um jovem médico de nome Silas...

E, dando-nos a conhecer a extrema fixação mental a que se ajustava, exclamou sussurrante:

- Onde está Silas que também não me ouve? A princípio... contrariava-se com a minha presença... Entretanto... com o tempo... tornou-se-me um filho do coração, condescendente amigo... Silas!... sim... sim... quem me fez recordar o passado?!...

Agigantava-se-nos a constrangedora surpresa.

Ambos os socorristas caíram de joelhos em pranto insofreável.

Num átimo, entendemos tudo, rememorando a noite inolvidável em que Silas algo nos falara de sua história comovente.

A pobre dementada era Aída, a madrasta sofredora.

Somente agora percebíamos que o Instrutor e o Assistente haviam sido, entre os homens, pai e filho...

 Daí, a discreta intimidade com que se associavam, automaticamente, em todos os serviços.

Decerto - pensei -, haviam abraçado aflitiva missão naquele perseguido instituto de caridade, não apenas atendendo aos desencarnados infelizes, mas também com elevados objetivos do coração.

Entretanto, não consegui divagar muito tempo, de vez que Druso, num gesto enternecedor, recolheu a infortunada criatura nos braços generosos e, genuflexo, após conchegá-la de encontro ao peito, exclamou para o Alto, com voz sumida em lágrimas:

- Obrigado, Senhor!... Os penitentes como eu encontram igualmente o seu dia de graças!... Agora que me devolves ao coração criminoso a companheira que envenenei no mundo, dá-me forças para que eu possa erguê-la do abismo de sofrimento a que se precipitou por minha culpa!...

 Notava-se-lhe o esforço para continuar clamando pela Compaixão Celeste; no entanto, os soluços embargaram-lhe de todo a voz, enquanto vasto jorro de safirina luz fluía do teto, como se a Infinita Bondade respondesse, de imediato, à comovente súplica.

Silas, extremamente abatido, ajudou-o a levantar-se e ambos se afastaram, carregando consigo aquele trapo de mulher, com a solene emoção de quem havia conquistado precioso troféu.

Informados de que o serviço magnético não teria prosseguimento naquela noite, retiramo-nos para nosso aposento particular, confiando-nos ao estudo das nossas impressões.

. . .