Olá amigos!
Ouçam abaixo um trecho do livro Contos Desta e Doutra Vida
29 - O ESCRIBA INCRÉDULO
29 - O ESCRIBA INCRÉDULO
Descansava Jesus em casa de Igorin, o curtidor, no vilarejo de Dalmanuta, quando Joab,
escriba em Cesareia, partiu à procura dele, em companhia de Zebedeu, pai de Tiago e João,
que lhe devotava imensa estima.
Enquanto caminhava, depois de largada a barca, o amigo da cidade, que jamais contemplara
o Doce Nazareno, falava compungido de mágoas que sofrera.
Sentia-se doente, em suprema revolta.
Desejava escutar o verbo do Senhor para certificar-se quanto à própria conduta.
Dizia-se crivado de injustiça e calúnia.
Permutavam, assim, impressões espontâneas e afetuosas quando o lar de Igorin lhes surgiu
pela frente, ao longe.
Ao redor do tugúrio, congregavam-se enfermos, avultando, entre eles, um homem maduro e
esbelto a gritar, estentórico, e que, guardado à pressa, excluiu-se do quadro, desafiando,
assim, a curiosidade de ambos os viajores.
No átrio da casa pobre, indaga Zebedeu de uma velha aleijada quem era aquele mísero, e
informa-lhe a anciã que se tratava de um louco infeliz à procura do Mestre.
Nisso, Tiago e Pedro aparecem de chofre e dizem que Jesus pretendia ausentar-se para a
prece nos montes.
Joab, ouvindo isto, penetra sozinho pela casa, e encontra em quarto humilde o Cristo
generoso, meditando em silêncio.
-Mestre! –clama, chorando, depois de confortado às saudações primeiras – tenho o peito
dorido e o pensamento em fogo, humilhado que estou por injúrias atrozes. Feriram-me,
Senhor, enodoando-me o nome e furtando-me o pão... Que fazer ante o mal que me ataca,
insolente? de que modo portar-me, perante os inimigos que me cobrem de lodo?
-Perdoa, filho meu! –disse o Amigo Celeste.
-Senhor, como esquecer malfeitores e ingratos?
-Anotando-lhes sempre a condição de enfermos.
-Enfermos? como assim, se perseguem matando?
-Não procederiam desse modo se não fossem dementes.
-Mestre – insistiu Joab -, convém esclarecer que os meus adversários são ladrões
perigosos...
-São, pois, mais infelizes...
-Infelizes porque? se tem casas faustosas e terras florescentes?
-Todavia, amanhã descerão ao sepulcro, abandonando o furto a mãos que desconhecem...
-Entretanto, Senhor, sem qualquer razão justa, eles querem prender-me.
-Não importa, meu filho, pois todo delinqüente está preso em si mesmo às algemas da treva.
-Mestre! Mestre! Ainda assim, espreitam-me igualmente em tocaia sinistra, prelibando-me a
morte, todos eles armados de punhais assassinos!...
-Perdoa e ora por eles – disse o Cristo, sereno -, porque é da Eterna Lei que a justiça se
faça... Todo aquele que fere será também ferido...
O escriba, em desespero, ajuntou lacrimoso:
-Senhor, estou sozinho, despojado de tudo...
Iludiram-me a esposa e roubaram-me os filhos...
Acusado sem culpa, o cárcere me espera; venerei sempre as leis, guardando-lhes os
princípios e toda a minha dor nasce da sombra hostil da infâmia que me cerca! Que fazer,
Benfeitor, ante as garras da lama?
-Filho, perdoa sempre, olvida todo mal e faze todo o bem, porque somente o bem é luz que
não se apaga...
Incapaz de conter o assombro que o traía, Joab esgueirou-se de soslaio, perguntando lá fora
aos amigos surpresos:
-Dizei-me, por favor, onde acharei o Mestre Jesus? quero Jesus para ouvir-lhe a palavra!...
O escriba renitente conservava a impressão de ter ouvido o louco que avistara ao chegar
àquela casa, e não o próprio Cristo...
Fonte: Contos Desta e Doutra Vida, Framcisco Candido Xavier, pelo Espírito Irmão X